O post de hoje é uma pequena análise da relação entre texto e imagem de uma cena retirada de um livro infantil que conta a história de Rapunzel.
Podemos observar no texto verbal uma sentença declarativa: "Ao completar doze anos, Rapunzel foi trancada pela bruxa no alto de uma torre sem portas e com uma pequena janela". Essa sentença estabelece uma direção baixa com relação ao leitor, pois apenas está informando algo sem requerer a sua participação. Além disso, o verbo aparece em terceira pessoa, confirmando a baixa direção. Com relação à imagem, há ausência de olhar da personagem, o que também indica uma baixa direção. Desse modo, o verbal e o visual convergem quanto à direção.
Quando analisamos a distância social, percebemos que a voz verbal é passiva e há também uma oração subordinada (adverbial temporal), bem como a imagem apresenta um close longo, o que, portanto, representa um grande distanciamento. Novamente, há uma convergência entre o texto e a imagem.
Por último, no que diz respeito ao envolvimento, notamos a ausência de pronomes possessivos e os demais pronomes estão na terceira pessoa, indicando um envolvimento fraco. Na imagem, o envolvimento também é fraco, pois o ângulo é oblíquo (apresenta a personagem e o cenário numa dimensão quase que de cima para baixo). Assim, o verbal e o visual também são convergentes nesse aspecto.
Concluindo, temos uma convergência entre texto e imagem em todos os níveis analisados (direção, distância social e envolvimento) e isso tem relação de significância com o propósito comunicativo do gênero (uma adaptação de conto de fadas para crianças), o qual, neste caso, apenas conta uma história sem exigir muito envolvimento ou participação do leitor e também se apresenta de forma coerente, visto que não aparecem divergências de significado.
Referência
BRASIL. Ministério da Educação. (Org.). Rapunzel [recurso eletrônico]. Brasília: MEC/Sealf, 2020. (Coleção conta pra mim).
Caros leitores, neste post, apresentaremos uma breve análise de imagens extraídas da campanha “Redondo é sair do seu passado”, lançada pela Skol no dia 8 de março de 2017, à luz das metafunções e da FAMILY framework de Lim-Fei e Tan (2017).
ASSISTA AO VÍDEO:
INTRODUÇÃO
A campanha publicitária é um conjunto de estratégias criadas para divulgar uma marca ou um produto. Nesse sentido, ela constitui um tipo de propaganda que, como tal, tem o objetivo de atrair determinado perfil de consumidor. No Brasil, as campanhas publicitárias de cerveja costumavam, até pouco tempo, associar o produto que veiculavam a corpos de mulheres as quais eram objetificadas. Isso era resultado, em parte, da cultura machista e, por outro lado, do fato de o público consumidor ser predominantemente masculino. No entanto, com o crescimento de movimentos sociais, como o movimento feminista, e com os rearranjos pelos quais a sociedade passou, algumas discussões começaram a ser feitas em torno dessa temática e, aos poucos, as grandes cervejarias foram se adaptando para atrair um novo perfil de consumidor. Nesse cenário, a mulher, antes vista apenas como um objeto de desejo para atrair consumidores, passa a também ocupar o papel de consumidora crítica que não compra qualquer discurso. Nesse contexto, a Skol, uma famosa marca de cerveja brasileira, produziu, em 2017, uma campanha, intitulada “Redondo é sair do seu passado”, com a “tentativa de reconciliação da marca com o público feminino” (FORTES, 2018, p. 60).
O vídeo de lançamento da campanha conta com a participação de seis ilustradoras que recriam pôsteres antigos da Skol a partir de uma visão feminista e propondo a valorização da mulher em suas características distintas em detrimento do estereótipo de “mulher gostosa” que foi exaltado pela marca durante décadas.
A nossa análise se baseia nos estudos multimodais de Lim-Fei e Tan (2017), que fazem uma adaptação da teoria proposta por Halliday (1985) e também dos estudos aristotélicos sobre persuasão (Ethos, Logos, Pathos).
PRESSUPOSTOS TEÓRICOS
A partir da década de 1980, a mídia, através de campanhas publicitárias, começou a mudar a representação sobre a mulher e a desfazer a imagem de objetificação que antes era construída por ideais machistas, passando, então, a assimilar conceitos feministas e a construir essa representação a partir de uma nova perspectiva: o empoderamento feminino (FORTES, 2018).
Nesse sentido, atualmente, no mercado publicitário, uma prática tem ganhado destaque, o Femvertising, que vem da junção de duas palavras em inglês: feminine (feminino) + adversiting (propaganda), ou seja, trata-se de propagandas que valorizam o empoderamento feminino. Esse conceito foi criado em 2014, pelo grupo She Media. Isso justifica a preocupação da Skol em reformular suas campanhas publicitárias de cerveja.
Partindo para o viés da multimodalidade, os novos estudos sobre (multi)letramentos transformaram o modo de se compreender um texto e seus sentidos e também trouxeram novas e importantes reflexões sobre o processo de comunicação.
A abordagem multimodal leva em consideração como as escolhas de linguagem e imagem (bem como outras) atendem aos propósitos do texto, o público e o contexto, e como essas escolhas funcionam juntas na organização e no desenvolvimento de informações e ideias (LIM-FEI; TAN, 2017, p. 3, tradução nossa).
Os autores nos quais nos apoiamos nesta análise, Lim-Fei e Tan (2017), elaboraram um trabalho no campo da multimodalidade para desenvolver uma abordagem Sistêmica e um Quadro de FAMÍLIA (FAMILY Framework) voltado para o desenvolvimento de habilidades de alunos do ensino médio sobre significados em textos multimodais. No entanto, suas importantes contribuições podem ser levadas para além do ambiente escolar.
Sobre a teoria proposta, é preciso, primeiramente, entendermos a base sobre a qual ela se assenta. A abordagem parte da Análise do Discurso Multimodal Sistêmico-Funcional e se baseia em noções dos estudos midiáticos e retóricos. É válido ressaltar que “a teoria sistêmica é uma teoria do significado como escolha, pela qual a linguagem, ou qualquer outro sistema semiótico, é interpretada como redes de opções entrelaçadas” (HALLIDAY, 1994 apud LIM-FEI; TAN, 2017, p. 9). Dela é extraído o conceito de metafunções da linguagem: ideacional, interpessoal e textual. Metafunção é a manifestação de toda a finalidade do uso da linguagem no sistema da língua: compreender o meio, relacionar-se com os outros e organizar informações.
Lim-Fei e Tan (2017) desenvolvem um FAMILY framework (uma espécie daquilo que conhecemos como mapa mental), representado abaixo:
Caros leitores, o post de hoje é uma proposta de atividade multimodal para ser trabalhada com alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, com base na Pedagogia dos Multiletramentos, mais especificamente focada na "aprendizagem por design" (Learning by Design), de Kalantzis e Cope (2005). Esta atividade surge como resposta à seguinte problemática: de que modo é possível promover o letramento crítico por meio de análises visuais de imagens?
Introdução
Esta atividade parte de uma proposta de leitura crítica de imagens retiradas de um videoclipe. O videoclipe em questão é da música "Same love", da dupla de hip hop Macklemore e Ryan Lewis, com participação de Mary Lambert, que foi lançada no álbum The Heist em 18 de julho de 2012, nos Estados Unidos, e aborda uma questão social problemática nos tempos atuais: a homofobia. A história contada no videoclipe, basicamente, trata sobre o ciclo da vida, do nascimento até a morte, abordando as várias fases pelas quais todas as pessoas passam, como infância, adolescência e vida adulta. O grande diferencial nesse processo é que a personagem principal não se identifica com os padrões tidos como normais pela sociedade e enfrenta alguns confrontos (internos e externos) até se assumir como homossexual e poder, finalmente, ser aceito e viver sua vida livremente. Além da temática principal, é possível perceber nesse texto multimodal outras questões que podem ser discutidas e exploradas de forma crítica, como os estereótipos sociais, a influência da religião na vida dos indivíduos, o preconceito, as lutas das minorias sociais etc.
A nossa análise é estritamente visual, mas é interessante frisar o contexto de produção da música do videoclipe, pois isso ajuda na construção dos possíveis sentidos que serão inferidos pelos alunos na análise. A letra faz referência à legalização do casamento entre pessoas do mesmo sexo nos EUA, sendo, inclusive, utilizada na campanha para o referendo Washington Referendum 74, que foi mais tarde aprovado e permitiu de fato a união entre homossexuais no estado de Washington.
Ademais, passemos agora a alguns princípios teóricos que são importantes para a fundamentação da atividade.
Perspectiva teórica
Primeiramente, é importante contextualizar o gênero a ser trabalhado, o videoclipe. Esse termo começou a ser utilizado na década de 1980 e, em termos gerais, se refere à técnica de fazer o recorte de imagens, fazendo colagens em forma de narrativa a qual é contada em vídeo (CORRÊA, 2006). Videoclipes pertencem aos gêneros musicais e, conforme Soares (2009, p. 29), são audiovisuais que se constroem "a partir de uma esfera relacional entre música e imagem, sendo um dos alicerces da indústria fonográfica e do lançamento de novos CDs".
A partir disso, percebemos que trata-se de um gênero multimodal. Assim, recorremos à Pedagogia dos Multiletramentos, fundamentada a partir do New London Group (1996), que incorpora quatro componentes fundamentais para o ensino: Prática Situada, Instrução Aberta, Enquadramento Crítico e Prática Transformada. Esta Pedagogia, portanto, baseia-se na incorporação de aspectos sociais, econômicos e também tecnológicos no ensino de modo a tornar o aluno um sujeito crítico ou, em outras palavras, um sujeito agentivo.
Multiletramento, nesse sentido, diferencia-se do modelo convencional de letramento escolar que é focado apenas na aquisição de habilidades e, raras vezes, no domínio de práticas sociais. No contexto de sala de aula, trabalhar com práticas de multiletramentos tende a provocar uma mudança de perspectiva, promovendo debates importantes que geram criticidade e preparam os alunos para se posicionarem como sujeitos construtores de conhecimento, ao invés de receptores passivos.
Nesse sentido, Kalantzis e Cope (2005), com o objetivo de promover uma transformação da aprendizagem, propõem, a partir do arcabouço teórico já postulado pelo New London Group, a aprendizagem por Design. A noção de Design em multiletramento é construída com base na variabilidade de recursos que servem a diversos propósitos em diferentes contextos sociais e culturais. Em resumo, esses autores complementam a Pedagogia dos Multiletramentos, desenvolvendo quatro noções básicas para o conhecimento: experimentando, conceitualização, analisando e aplicando. "O foco do Learning by Design está no significado e na ação como formas de conhecimento e os quatro processos de conhecimento [...] são as partes constituintes disso" (YELLAND; KALANTZIS; COPE, 2008, p. 203).
Assim, como forma de colocar o "saber em ação", partimos para uma proposta de leitura crítica visual, que visa estabelecer uma percepção crítica no aluno para que, a partir disso, ele possa criar novos conhecimentos que sirvam não somente para o desenvolvimento de uma atividade meramente escolar, mas para a construção de sentidos que o acompanhem em suas vivências sociais.
Atividade: leitura crítica de videoclipe para turma de 9º ano do Ensino Fundamental
Após assistir ao videoclipe abaixo (Same love - Macklemore & Ryan Lewis Feat. Mary Lambert), analise as imagens apresentadas a seguir e responda as questões propostas.
QUESTÃO 1 - Que cena esta imagem retrata e que elementos o fazem inferir isso?
QUESTÃO 2 - Comparando essas duas cenas, quais as diferenças são perceptíveis entre elas e quais sentidos podem ser produzidos a partir disso?
QUESTÃO 3 - O que essa imagem representa para você?
QUESTÃO 4 - Quais as diferenças entre as duas cenas da imagem abaixo? Que sentimentos essa imagem provoca em você?
QUESTÃO 5 - Observando os elementos que compõem essa imagem, descreva que cena do cotidiano ela retrata ou pode retratar.
QUESTÃO 6 - Você consegue identificar o contexto no qual essa imagem foi feita? Quais sentidos podem ser produzidos a partir dela?
QUESTÃO 7 - Você já viu alguma cena parecida com essa imagem? O que ela significa?
QUESTÃO 8 - Que sentimentos a imagem abaixo desperta em você? Com base nos vários elementos perceptíveis nela, você considera essa cena comum ou incomum? Justifique.
QUESTÃO 9 - Observando atentamente essa imagem, qual relação ela tem com o videoclipe que você assistiu? Quais sentidos podemos produzir a partir dela?
QUESTÃO 10 - O que você acha que está acontecendo nessa imagem? Com base nas suas inferências, escreva duas possíveis sequências para ela.
Conclusão
Apesar de essa atividade não ter sido ainda aplicada no contexto de sala de aula, no desenvolvimento dela pudemos perceber que aliar o letramento multimodal e a aprendizagem por design ao ensino, sobretudo o de línguas, confere um grande diferencial no desenvolvimento dos alunos. Respondendo ao questionamento inicial, concluimos que o letramento crítico por meio da análise de imagens pode ser promovido em atividades como essa que incentivem o aluno a explorar seus conhecimentos e a transformá-los em ações concretas que serão repercutidas no contexto social, gerando mais e mais aprendizados.
Referências:
CORRÊA, Laura Josani Andrade. Breve história do videoclipe. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO DA REGIÃO CENTRO-OESTE, 8., 2006, Cuiabá. Anais [...]. Cuiabá: Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, 2006. p. 1-15.
GABI. Assunto LGBT + - Same Love. Amino (página de blog). 2017. Disponível em: https://aminoapps.com/c/comunidade-lgbt/page/blog/assunto-lgbt-same-love/aVkz_pXef0uaBrXPjl8BvW7r2vBnl8qR6J0. Acesso em: 12 jun. 2021.
KALANTZIS, M.; COPE, B.; The Learning by Design Project Group. Learning by desing. Melbourne, Austrália: Victorian Schools Innovation Commission, 2005.
MACKLEMORE LLC. Macklemore & Ryan Lewis -
Same Love feat. Mary Lambert (Official Video). Youtube, 02 out. 2012. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=hlVBg7_08n0. Acesso em: 25 maio 2021.
SOARES, Thiago. A construção imagética dos videoclipes: canção, gêneros e performance na análise de audiovisuais da cultura midiática. 2009. 303 f. Tese (Doutorado em Comunicação e Cultura Contemporâneas) – Universidade Federal da Bahia, Salvador, 2009.
YELLAND, Nicola; COPE, Bill; KALANTZIS, Mary.'Learning by Design: creating pedagogical frameworks for knowledge building in
the twenty-first century'. Asia-Pacific Journal of Teacher Education, v. 36, n. 3, p. 197-213, 2008.
Assim como definir o que é Literatura ou o que é Arte não é uma tarefa fácil, por mais que possa parecer algo simples para o senso comum, definir o que é texto também tem seu grau de complexidade. Isso porque não há um consenso que universalize o conceito de texto, pois cada área da Linguística o define a partir de sua própria percepção. Desse modo, quando propomos uma definição de texto, por mais generalista que essa definição seja, temos que considerar de qual perspectiva estamos nos valendo. Assim, pretendemos expor aqui algumas definições diferentes para esse objeto de estudo e discussões, partindo dos pressupostos teóricos da Linguística Textual e relacionando-os com outras áreas.
Halliday e Hasan (1985), autores clássicos e basilares para o estudo da textualidade, já diziam que o texto é um caminho para a compreensão da linguagem e não pode ser separado do seu contexto, o qual inclui aspectos que vão além da linguagem verbal.
Grosso modo, podemos dizer que a concepção de texto mais aceita atualmente e sobre a qual nos apoiamos é a que o compreende como um produto “multifacetado”, dentro de uma visão sociocognitiva-interacionista. Isso quer dizer que, nessa visão, ele é tido como um produto inacabado, construído plenamente apenas na interação entre sujeitos e entre estes e o meio em que se encontram, e não somente por meio dos fatores linguísticos, o que, portanto, o torna cheio de faces.
Como discorrem Koch e Elias (2016) no artigo “O texto na linguística textual”:
[...] o texto é uma realização que envolve sujeitos, seus objetivos e conhecimentos com propósito interacional. Considerando que esses sujeitos são situados sócio-histórica e culturalmente e que os conhecimentos que mobilizam são muitos e variados, é fácil supor que o texto 'esconde' muito mais do que revela a sua materialidade linguística (KOCH; ELIAS, 2016, p. 32).
Mas até que se chegasse a essa visão sociocognitiva-interacionista, o texto foi compreendido, inicialmente, como uma unidade linguística maior que a frase, que tinha, necessariamente, um começo e um fim bem delimitados e que era analisado independentemente de seu contexto de produção. Sequencialmente a essa primeira fase, os estudiosos perceberam a importância do contexto de produção textual e passaram a considerar o texto como a unidade básica da comunicação humana e como uma atividade interativa. Essa concepção, no entanto, ainda não dava conta de explicar alguns fatores na produção/recepção textual, pois se baseava em uma perspectiva textual-discursiva, limitada aos aspectos imanentemente linguísticos. Foi, então, que surgiu nos estudos do texto uma nova forma de abordagem que o encarava como um processo sociocognitivo.
Koch (2009) caracteriza essa fase de estudos sobre cognição dentro da LT como a virada cognitivista. A autora faz um delineamento desse período que inicia na década de 80, a partir do momento em que se tomou consciência de que a cognição influencia diretamente em toda e qualquer ação que se realiza e no processamento de informações, através de modelos mentais de operações preestabelecidos. Desse modo, o texto passou a ser visto como o “resultado de processos mentais” (KOCH, 2009, p. 21). Essa visão foi importante para se estabelecer certos modelos cognitivos de conhecimentos socioculturalmente adquiridos e para se entender que o processamento textual é motivado por esses modelos.
Com a evolução dos estudos acerca da cognição atrelada à linguagem, os estudiosos começaram a ter divergências quanto à definição do modelo cognitivista. A partir dessas divergências, novas teorias foram surgindo dentro dos estudos sobre cognição. Os novos questionamentos levaram a uma abordagem da cognição no sentido social, dando origem ao modelo sociocognitivista de concepção da linguagem. Dessa forma, do ponto de vista textual, os fatores externos ao indivíduo também influenciam na formação de sentidos e na interpretação de um texto, ou seja, o sentido não é produzido única e exclusivamente na superfície cognitiva individual, mas através da interação do sujeito com a sociedade.
Partindo para outras áreas do conhecimento, percebemos que a concepção de texto tem sentidos diversos, mas complementares. Para a Análise do Discurso, por exemplo, o texto é o lugar onde se materializam os discursos. Desse modo, como afirma Orlandi (1995), ele é a unidade básica, mínima de significação. Um outro conceito que corrobora, ao tempo em que atualiza, essa concepção da Análise do Discurso - ainda que parta de uma corrente teórica diferente - é o de Xavier (2002, p. 21), que diz que "textos são resultados de cruzamentos entre um conjunto de matrizes: linguísticas [...], tecnológicas [...] e históricas [...]". Esse autor também afirma que o texto não pode ser encarado como um produto finalizado, mas sim como um objeto que está sendo construído. Essa abertura para as tecnologias possibilita o surgimento de uma nova concepção de texto: o hipertexto. Segundo Xavier (2002), hipertexto é um espaço próprio do ambiente virtual que possibilita a construção de sentidos (assim como o texto), com o diferencial de ser exclusivamente digital. Em outras palavras, refere-se às inúmeras possibilidades que o ambiente digital tem para estabelecer conexões entre vários textos, por meio de links e outros mecanismos próprios.
Essa concepção só foi possível a partir do surgimento e do avanço da internet. Assim, percebemos que o texto é uma produção que acompanha os avanços tecnológicos. Se voltarmos um pouco na História, encontraremos as primeiras produções textuais, por assim dizer, representadas nas figuras rupestres, datadas ainda no período pré-histórico, muito antes da invenção da escrita. Atualmente, com a "explosão" da internet, é comum que os textos sofram constantes transformações devido ao contato com as mídias digitais. Uma dessas transformações na materialidade textual, mas que interfere também na forma, no conteúdo e, principalmente, nas possibilidades de construção de sentidos, são os chamados textos multimodais. A multimodalidade é uma teoria que extrapola o campo de estudo da LT e é assunto para um outro post. No entanto, de modo genérico, os textos multimodais "são aqueles que se utilizam de mais de um código semiótico, como, por exemplo, os que combinam o código visual e o verbal" (KRESS; VAN LEUWEEN, 1996 apud CAVALCANTE; CUSTÓDIO FILHO, 2010, p. 65). Por mais que essa definição abranja bem mais do que o ambiente virtual, este possibilitou uma ampliação na produção e recepção dos textos multimodais, sobretudo pelo caráter dinâmico que lhes confere.
Com esta breve exposição feita sobre o texto, percebemos que, de fato, trata-se de um conceito "multifacetado", que extrapola os estudos e teorias linguísticas.
Até a próxima, caro(a) leitor(a)!
Referências:
CAVALCANTE, Mônica Magalhães; CUSTÓDIO FILHO, Valdinar. Revisitando o estatuto do texto. Revista do GELNE, Piauí, v. 12, n. 2, p. 56-71, 2010.
HALLIDAY, M. A. K.; HASAN, R. Language, context, and text: aspects of language in a social-semiotic perspective. Austrália: Deaking University, 1985.
KOCH, Ingedore G. V. Introdução à linguística textual: trajetória e grandes temas. 2. ed. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2009. (Coleção linguagem).
KOCH, Ingedore G. V.; ELIAS, Vanda Maria. O texto na linguística textual. In: BATISTA, Ronaldo de Oliveira (org.). O texto e seus conceitos. São Paulo: Parábola
Editorial, 2016.
ORLANDI, Eni Puccinelli. Texto e discurso. Organon, v. 9, n. 23, 1995.
XAVIER, Antonio Carlos dos Santos. O hipertexto na sociedade da informação: a constituição do modo de enunciação digital. 2002. 214 f. Tese (Doutorado em Linguística) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas-SP, 2002.